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‘O que se faz na Cop, fica na Cop’ – por Edyr Augusto Proença

COP30 em Belém do Pará: multidão, bandeiras e céu tropical

O primeiro-ministro alemão festejou dar o fora de Belém, embora tenha passado poucos dias aqui. No entanto, o verão alemão mata e o daqui, não. Aqui, no verão, chove todos os dias. No inverno, chove o dia todo. Estamos no final do verão. De vez em quando a chuva dá a impressão de ser o fim do mundo. Mas passa em vinte minutos. As ruas enchem de água. Os homens passam asfalto em tudo e a água precisa escoar. Em outros vinte minutos, está tudo bem e até fresquinho. As ruas estão cheias de gente. Nos pontos turísticos, quase não há espaço.

Conversei com um americano. Pediu um cigarro. Abriu a carteira com dólares. Não precisa. Morou em Salonica, Grécia. Está adorando. Seus amigos se encharcam de maniçoba e cachaça de jambu. Lábios tremendo. A ONU não gostou das manifestações. E daí. As pessoas querem falar. Indígenas, quilombolas, paraenses, todos atingidos pelos danos climáticos.

O presidente Lula disse que acabou a fase das promessas. Chegou a hora da onça beber água. Tédoidé? No domingo de folga houve engarrafamento de canoas atravessando para o Combu, onde bares, restaurantes e hotéis são uma delícia, inclusive para o skyline de Belém e seus prédios ao fundo.

Moro em uma selva de concreto com dois milhões de habitantes, fincada na maior floresta tropical do mundo. Quando essas duas realidades se encontram, tudo pode acontecer. Os canadenses estavam boquiabertos no Crocodilo, aparelhagem sonora, chamada também de “treme terra”, cujo símbolo é um gigantesco “croc” cheio de luzes e olhar malicioso.

Na chamada Bluezone, indígenas tentam invadir, rodas de carimbó contagiam e gringos vêm e vão apressados, com suas mochilas e algum adereço local, tipo um brinco “Égua” na orelha. O governo deu uma guaribada na cidade. O Parque recebe a COP30. Tráfego intenso. Babel. Passam africanos com turbantes e longas batas, passam dançarinos de carimbó que saíram de um show.

Há filas nos espaços dos países para ganhar brindes. Gilberto Gil foi nas três apresentações da ópera de sua autoria mais libreto de Paulo Coelho, no Teatro da Paz. Aplaudido de pé. Marina também esteve lá. Engole toneladas de sapos com os poços na costa do Amapá. Mas foi aplaudida. Janja também. Al Gore foi, mas ninguém percebeu. Outros políticos americanos, de oposição, apareceram, para marcar presença.

A política estraga tudo. Trump faz falta? Sei lá. Ney Matogrosso fez show para angariar money para o Pantanal. Ingressos caríssimos. Mas lotou, ele adorou e foi bonito mesmo, pá. Fafá de Belém, onipresente, também cantou, lotou e emocionou.

Agora é que tudo vai acontecer. Ministros de Estado estão na área. Se derrubar é penalty. Esquadrões de jatos e helicópteros fazem rasantes e levam longe o telhado dos mais pobres. É a COP30, sim? E quem reclama dos preços altos? Se soubessem o quanto pagamos mais caro para ir ao Sudeste… Frete grátis para todo o Brasil, menos para o Norte.

Proporcionamos energia elétrica pra todo mundo e ainda pagamos mais caro. Tédoidé? Quem vai pagar a conta? Divide e joga no cartão? Pendura? Tem financiamento. Tem a adaptação climática. Tem a Amazônia e a Petrobrás na Amazônia. E a energia renovável com todo esse sol, que fez o alemão ficar vermelho e reclamar. Tem descarbonização. Grandes temas.

Mas espera aí, e os amazônidas puderam se fazer ouvir? No campus da Ufpa houve bastante discussão, mas acho que quem devia ouvir, não ouviu. Aparecem muitos “especialistas”, cheios de cursos e títulos, mas nunca vieram até aqui. Somos insulares. Demos nosso jeito. Por isso somos diferentes.

Para visitar nossos vizinhos no Maranhão, Amazonas, Amapá, Tocantins e outros, pegamos um boeing. Amigos me diziam, quando tivesse tempo, desse um pulo em Manaus para comprar qualquer coisa. E o boeing, quem paga? Na green zone, em frente do QG do Exército, o pau tóra. Sei lá quantas pessoas. O som deve chegar a São Paulo. A fumaça dos churrasquinhos também. Toda noite.

O mesmo na Estação das Docas, na Feira do Açaí, Ver o Peso, Mercado de São Braz. Será que dá vontade de voltar para os debates? Depois da COP é melhor fazer procuração de gringos perdidos ou que decidiram fincar bases na floresta. Belém está em festa como poucas vezes. Bem, tem o Círio, mas é outra pegada.

Gringos e locais caminham pelas ruas em bando, de festa em festa. As meninas garantem que muitos se deram bem. O que se faz na COP, fica na COP. Dá pra ter COP todo ano, aqui? Sorriso sonso nos rostos dos jornalistas sudestinos que tanto voduzaram Belém. Estão apaixonados.


Foto do autor

Edyr Augusto Proença é jornalista, escritor, dramaturgo e diretor de teatro, trabalhou como radialista e redator publicitário e também produziu jingles. Suas narrativas estão todas ancoradas na realidade paraense. Em 2013, com a publicação de Os éguas na França (com o título Belém), o autor ganhou destaque na cena literária parisiense. O livro recebeu, em 2015, o prêmio Caméléon de melhor romance estrangeiro, na Université Jean Moulin Lyon 3. Desde então, seus romances vêm sendo traduzidos para o francês. Pela Boitempo, publicou Eu já morri, Geração 90 – Os transgressores, Casa de caba, Um sol para cada um, Selva concreta, Pssica, Belhell, Os éguas e Moscow. Página do autor na editora BoiTempo editorial: https://www.boitempoeditorial.com.br/edyr_augusto?srsltid=AfmBOop77J5UuQjhrM2qJi8WqRWEJvV2EN9SdN1VPLsJIfjlsnBu7EzT

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