Mário Quintana é um dos mais queridos e populares escritores do Brasil. Poeta das singelezas, mestre dos aforismos, deixou uma vasta contribuição para nossa literatura. Quintana foi também tradutor – é dele a tradução de dois clássicos da literatura: Em busca do Tempo Perdido, de Marcel Proust, e Mrs. Dalloway, de Virginia Woolf.
Quintana continua presente no imaginário coletivo, dividindo o posto, ao lado de Clarice Lispector, de autores brasileiros mais citados e parafraseados na internet, sobretudo nas redes sociais.
Considerado um dos maiores poetas do século XX, Mário Quintana nasceu em 1906, na cidade de Alegrete, no Rio Grande do Sul. Filho de Celso de Oliveira Quintana, farmacêutico, e de Virgínia de Miranda Quintana, foi mestre da palavra, do humor e da síntese poética, recebendo, em 1980, o Prêmio Machado de Assis da ABL e, em 1981, foi agraciado com o Prêmio Jabuti. Faleceu em 5 de maio de 1994, no hospital Moinhos de Vento, Porto Alegre, Rio Grande do Sul.
Deixa-me seguir para o mar
Deixa-me seguir para o mar Tenta esquecer-me… Ser lembrado é como evocar-se um fantasma… Deixa-me ser o que sou, o que sempre fui, um rio que vai fluindo… Em vão, em minhas margens cantarão as horas, me recamarei de estrelas como um manto real, me bordarei de nuvens e de asas, às vezes virão em mim as crianças banhar-se… Um espelho não guarda as coisas refletidas! E o meu destino é seguir… é seguir para o Mar, as imagens perdendo no caminho… Deixa-me fluir, passar, cantar… toda a tristeza dos rios é não poderem parar!
Presença
É preciso que a saudade desenhe tuas linhas perfeitas, teu perfil exato e que, apenas, levemente, o vento das horas ponha um frêmito em teus cabelos… É preciso que a tua ausência trescale sutilmente, no ar, a trevo machucado, as folhas de alecrim desde há muito guardadas não se sabe por quem nalgum móvel antigo… Mas é preciso, também, que seja como abrir uma janela e respirar-te, azul e luminosa, no ar. É preciso a saudade para eu sentir como sinto – em mim – a presença misteriosa da vida… Mas quando surges és tão outra e múltipla e imprevista que nunca te pareces com o teu retrato… E eu tenho de fechar meus olhos para ver-te.
A verdadeira arte de viajar
A gente sempre deve sair à rua como quem foge de casa Como se estivessem abertos diante de nós todos os caminhos do mundo. Não importa que os compromissos, as obrigações, estejam ali… Chegamos de muito longe, de alma aberta e o coração cantando!
A canção da vida
A vida é louca a vida é uma sarabanda é um corrupio… A vida múltipla dá-se as mãos como um bando de raparigas em flor e está cantando em torno a ti: Como eu sou bela amor! Entra em mim, como em uma tela de Renoir enquanto é primavera, enquanto o mundo não poluir o azul do ar! Não vás ficar não vás ficar aí… como um salso chorando na beira do rio… (Como a vida é bela! como a vida é louca!)
Poeminha sentimental
O meu amor, o meu amor, Maria É como um fio telegráfico da estrada Aonde vêm pousar as andorinhas… De vez em quando chega uma E canta (Não sei se as andorinhas cantam, mas vá lá!) Canta e vai-se embora Outra, nem isso, Mal chega, vai-se embora. A última que passou Limitou-se a fazer cocô No meu pobre fio de vida! No entanto, Maria, o meu amor é sempre o mesmo: As andorinhas é que mudam.
- Poemas de Romério Rômulo: entre o carvão e excessos orbitais
- Mário Quintana: 5 poemas de um dos poeta mais amado do Brasil
- Herberto Helder — Seleção de poemas e apresentação biobibliográfica
- Flávio Viegas Amoreira: Capoeira: gestual sagrado de luz e sombra
- Três poemas do poeta e presidente de Angola livre, António Agostinho Neto
- Conto de Marina Colasanti: Menina de vermelho a caminho da Lua






