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‘Você vai ler o meu poema com os olhos, com as mãos’, por Romério Rômulo

Os poemas de Romério Rômulo exploram o lirismo existencial, linguagem intensa e fragmentada, o tempo, a memória e o amor se entrelaçam.
Há ecos de tradição literária, mas com rupturas formais e temáticas que denunciam um eu poético em crise?

Leia o meu poema

Você vai ler o meu poema
com os olhos, com as mãos
e a orientação meta-ficcional de Ítalo Calvino.

O que eu fiz para abastecer os seus rios
foi uma sangria sem tempo
e uma armadilha sem fim.

Se lido de cima pra baixo
o poema diz pouco. De baixo pra cima
nada diz. Vale intercalar os versos

e ver o poema desabastecido.
Se a manhã me subverte
eu não atendo o seu bater na porta

eu não revelo o quanto fui medonho
nem vou dizer do tempo que vivi.

§

Poema da inesquecível mulher

Eu, vero, me bati na tua porta:

mal caibo em mim, sem ti

no que importa

 

Sou trava de uma casa redigida

no vão da tua mão subtraída

 

A sede que me seca e que me late

é o cão da tua mão que me abate

 

Tivesse o sumo, a boca, o teu

retrato

teria o que não sou, quadro

abstrato

 

Pela manhã mais brusca e

ressurgida

vou me contar e te entregar a vida.

 

§ 

E como eu morresse a cada passo

de Minas

 

E como nós 2 só cabemos no

escuro

num rasgo da paixão desesperada

pedaços estridentes de um muro

que atravanca o ritmo da estrada

 

Pobres nós 2, estranhos e mortais

sabemos que a vida é força quente

estranhos dos infernos, e bem mais

que o nosso amor é fogo e é

serpente.

 

§ 

2.

 

E como eu morresse em cada passo

de Minas, caminho da sangria

na cara de um Cristo em estilhaço

com um cravo na mão já toda fria

 

E como eu só perdesse a carapaça

nos pedaços do tempo que me cria

nestas ruas verdugas de trapaças

na cara de um Cristo em agonia.

 

3.

 

Uma cruz por aqui toda é fumaça

de uma sombra que chega e nunca

passa.

 

§ 

A máquina do mundo (pós-

Drummond), 2

 

E como eu não coubesse na

montanha

de tanto entardecer aqui no alto

que sobra em reticências de navio

 

E como eu não soubesse de um

braço

que no desvio da vida me coubesse

em tão mortais canções sem voz e

pátria

 

E como tudo aqui só renascesse

nuns rios podres e sem águas rasas

eu pude me rever sem

preconceitos.

 

Olhei meu antro, me calei de medo

como em quinhões de pedra eu me

comesse

em cada gomo e me arrebentasse

 

Sobraram duras missões em

minhas mãos

cobraram ouros que paguei sem

medo

e me retive sempre em olhar pra

nada.

 

Foto do autor

Romério Rômulo (poeta prosador) nasceu em Felixlândia, Minas Gerais, e mora em Ouro Preto, onde é professor de Economia Política da UFOP e um dos fundadores do Instituto Cultural Carlos Scliar – Rio de Janeiro RJ.

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