
O MAPA
Não se alumbra o meu olhar
ao sumiço de Ápacam; e sem
Ápacam e Anatnas semiapagada
para quê me serve o mapa?
As manchas não apontarão
meu reino, mas, minha ruína,
e é ruim na hora de ir… olhar ruir
à tempestade o meu império.
Quem o desbotou a águas impuras
do Íston, foste tu, Phostito!
Por isto destituo-te do título
de meu último tutor e te intimo
a meu ritmo estimular um
cálculo marítimo que me indique
Ápacam em um gráfico le
gítimo. Estimo-te, Phostito, mas
foste tu que me levaste a isto…
§§
PEDRA
O rio e o tempo
esmurram a mesma matéria
- aríete em riste
na textura da pedra -
a pedra sólida lida só
com o rio e o tempo
resiste ao soco líquido e à
corrosão dos séculos
O rio e o tempo
em busca do enigma da pedra
esmurram por fora
a matéria de dentro
§§
PUNHAL DE PEDRA
Não rasgaria a própria carne
com este punhal de pedra
- meu&teu - punhal de pedra.
Em punho o ponho a teu serviço
não para sangrar-te a voz, nem
para cortar-te as fibras do canto
mas para arrancar-te do peito
este poema - meu&teu - poema
que aos brutos causa espanto
§§
REFLEXÕES DA FLEXA
O longe é um lugar que não existe!
Atravessei-o ontem,
e a minha ponta é a de um seio,
e a minha ponte é o infinito.
Atravessei-o ontem,
in verso ao teu receio,
(e não ouvi sequer um grito)
e hoje irei atravessá-lo aflito
feito os olhos do arqueiro e,
os passos do proscrito.
Naquele dia a minha ponta
era um diamante; e aquele dia
o meu final previsto.
Maldito!
Mal sabia que o longe é o infinito
por onde estou passando,
e que eu – infinitamente – não existo.
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SENTENÇA
O que sabes de mim neste poema ósseo
(onde cavas a carne da cabra que o cobre)
a não ser o cálcio do seu verbo rubro
que labiríntima procuras em meu nome?
Sabes de mim o vocábulo deste túmulo,
a última sílaba do meu nome santo?
Ão de possuir-te esses demônios todos
na lápide do poema-pus após a morte!
dos meus abismos ao teu sinistro poente
a ponte sobre a página-pântano
conduz a Dante o meu poema infernal
que áspero o espera na cripta de Byron
onde Maldoror trêmulo de horror
descreve a Lautréamont a tua sentença...
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SESSENT'ANOS
Sessenta centauros
me perseguem e cem touros
me esperam em seus
estábulos hercúleos...
há séculos embolo-os
em páginas imaginadas
(híbridas manadas
de temíveis sonhos)
em dias nebulosos
que sonâmbulos perambulam
por meus sonos - cervos
imolados que renascem
aos librianos meses
de um outubro sessent'anos...
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DÉRAME E MIDERA
Midera foi-se com a sua foice de vidro,
ceifou o que me dera, Déreme,
devido eu duvidar
da vã quimera
que mera, Dérame me dera. Eram
meras Homéricas Dérame e Midera,
porém, astutas,
às tantas das manhãs apacamíadas
saíam em seus cavalos âmbares
a galoparem por sendas insondáveis,
livres entre livros indeléveis,
entre leves lidos livros
livrando-me
dos danos que Delyves, o Desdém,
desde dantes me impusera.
Dera-me Midara,
aVisão, a palavra-seta
que cita a voz de Dérame a prever-me
a um livro vão (por que não cri na deusa
mera? – a citar Midera como a deusa
que me dera a visão
que crer em Dérame.
Quem me dera ter vivido esta ilusão!
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É DIFÍCIL
É difícil erguer
edifício no espaço, não é fácil
guardar
o mar em orifício,
meu ofício é lidar com a flor do lácio
e lhe dar
a minha lida em sacrifício,
antes de achares fácil o meu feito
mais difícil...
***
- A Cartomante, de Machado de Assis – Uma leitura em HQ
- “A literatura como travessia: dos clássicos universais à alma brasileira”
- Em ‘Glossário de um Poeta’ – Edward Hirsch e o mistério da poesia
- ‘Antes de você’ há o poemas de Rosemeire dos Santos Silva




