“MALEGA: Não foi desta vez”, romance de Marilda Martins
Há livros que chegam como rios: não perguntam se podem entrar, apenas correm por dentro da gente.
“MALEGA: Não foi desta vez”, de Marilda Martins, é um desses rios. A autora nos confidenciou que foram mais de dois anos de escrita, e bem antes a preparação, a elaboração do projeto para a escrever, as indas e vindas impostas pela dificuldade de publicar um livro.
Nas suas águas misturam-se memórias de mãe e filha, histórias de migração, o silêncio pesado dos seringais e o canto leve de um jardim molhado de chuva. A cada página, não lemos apenas sobre Malega. A encontramos mulher amazônida, feita de força e ternura, parecendo carregar em si a vida inteira da floresta e a vida inteira de nossas avós.
Este não é um livro para se “consumir”. É um livro para se sentar diante dele, como quem ouve uma confidência, como quem segreda, como quem escuta a voz de alguém que já não está, mas insiste em permanecer.
E talvez seja esse o maior presente da obra: Lembrar-nos de que a literatura também é memória e que, ao narrar a história de uma mulher, Marilda Martins nos devolve um pedaço de nós mesmos.
Resenha
Há livros que a gente lê. E há livros que a gente atravessa. “MALEGA Não foi desta vez”, de Marilda Martins, é desses que não se contentam em ficar nas páginas. O romance entra pelos olhos, vai ao coração e, sem a gente perceber já está pulsando junto com nossas próprias memórias.
O fio que sustenta essa narrativa é Malega, a mãe. Uma mulher amazônida, de raízes profundas, feita de rio, mata e quintal, mas também de silêncios, dores guardadas e resistências segredadas. A vida dela poderia ter sido apenas mais uma história entre tantas, anônimas, mas Marilda Martins a recolhe e a oferece ao leitor como quem acende uma vela diante de um altar, para iluminar, para reverenciar, para não deixar apagar.
O livro inicia a partir de uma frase intrigante: “Não foi desta vez…” – dita por Malega, depois de um mal-estar. A filha se inquieta. O que não foi desta vez? A partir desse enigma, somos puxados para dentro de uma narrativa que não é só biografia, nem só memória. É um bordado de lembranças, afetos e revelações, em que cada ponto costura uma parte da história de uma mulher e, ao mesmo tempo, de uma família, de um povo.
A força do livro está em dois movimentos:
- de um lado, a intimidade familiar, feita de jogos de cartas madrugada adentro, de jardins cultivados com fé e esperança, de uma vida dura que não descansava;
- de outro, a grande narrativa histórica, que fala de migrações, dos seringais e castanhais, da Amazônia que foi tanto abrigo quanto prisão para muitas famílias, especialmente mulheres que sustentaram no corpo e na alma as dores da luta pela sobrevivência.
Há um estilo em Marilda Martins, ao mesmo tempo doce e cortante. Ela escreve como quem conversa na beira de uma rede, mas não suaviza as feridas. Fala da violência, dos abandonos, da dureza da lida. Ainda assim, há sempre um respiro, um detalhe singelo, a flor, a muda roubada de um jardim, o riso de uma criança, que devolve à vida sua ternura.
Ler MALEGA, de certo modo, é sentar-se à mesa com essa família, ouvir as histórias, rir e chorar junto. É também reconhecer algo que nos atravessa. Todos temos uma Malega em nossas famílias. Uma mulher que carregou o mundo nos ombros, que fez do silêncio um escudo, que, à sua maneira, lutou e resistiu.
Não leia o livro apressadamente. Ele pede entrega, pede que você escute. No fundo, não se trata apenas da história da autora e sua mãe, mas da história de todos nós, feita de perdas, resistências, fé e amor.
Ao fechar o livro, fica uma certeza: Ler MALEGA é também aprender a se reconciliar com a própria memória. É sentir que, mesmo diante das dores mais duras, há sempre um gesto de ternura que nos salva.
Um livro necessário, belo e profundamente humano.
🌿 Convite do Ver-O-Poema
Não se limite a folhear. Permita-se viver este livro. Sente-se na varanda com Malega, caminhe pelas ruas com suas mudinhas de plantas na mão, escute suas histórias e deixe-se afetar.

Gostei da resenha. E se a resenha é boa… Parabéns pra professora Marilda Martins.