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“Aos que Vão Nascer”: A Reflexão Profunda de Bertolt Brecht em Tempos Sombrios

Retrato de Bertolt Brecht em preto e branco

Aos que Vão Nascer: O Legado de Bertolt Brecht

Em meio ao caos político e social, poucos poemas capturam a angústia ética de viver em *tempos sombrios* com a mesma força de *An die Nachgeborenen*. Conhecido em português como “Aos que Vão Nascer”, este é um dos textos mais pungentes de Bertolt Brecht, escrito durante seu exílio na Dinamarca (entre 1934 e 1938), refletindo a ascensão do fascismo e a dificuldade de manter a moralidade em um mundo de injustiça.

O poema não é apenas um lamento sobre a crise, é um diálogo direto com as futuras gerações. Bertolt Brecht expõe a contradição de tentar ser “sábio” ou “gentil” enquanto se está imerso na luta pela sobrevivência e pela mudança.

“Aos que Vão Nascer”, na brilhante tradução de Paulo César de Souza, é um testamento atemporal que nos convida a refletir sobre o preço da luta e a esperança de um futuro onde “o homem seja parceiro do homem”.

Tradução

I É verdade, eu vivo em tempos negros. Palavra inocente é tolice. Uma testa sem rugas Indica insensibilidade. Aquele que ri Apenas não recebeu ainda A terrível notícia. Que tempos são esses, em que Falar de árvores é quase um crime Pois implica silenciar sobre tantas barbaridades? Aquele que atravessa a rua tranqüilo Não está mais ao alcance de seus amigos Necessitados? Sim, ainda ganho meu sustento Mas acreditem: é puro acaso. Nado do que faço Dá-me o direito de comer quando eu tenho fome. Me dá direito a comer a fartar. Por acaso fui poupado. (Se minha sorte acaba, estou perdido.) As pessoas me dizem: Coma e beba! Alegre-se porque tem! Mas como posso comer e beber, se Tiro o que como ao que tem fome E meu copo d`água falta ao quem tem sede? E no entanto eu como e bebo. Eu bem gostaria de ser sábio. Nos velhos livros se encontra o que é a sabedoria: Manter-se afastado da luta do mundo e a vida breve Levar sem medo E passar sem violência Pagar o mal com o bem Não satisfazer os desejos, mas esquecê-los Isto é sábio. Nada disso sei fazer: É verdade, eu vivo em tempos negros.   II À cidade cheguei em tempo de desordem Quando reinava a fome. Entre os homens cheguei em tempo de tumulto E me revoltei junto com eles. Assim passou o tempo Que sobre a terra me foi dado. A comida comi entre as batalhas Deitei-me para dormir entre os assassinos Do amor cuidei displicente E impaciente contemplei a natureza. Assim passou o tempo Que sobre a terra me foi dado. As ruas de meu tempo conduziam ao pântano. A linguagem denunciou-me ao carrasco. Eu pouco podiam fazer. Mas os que estavam por cima Estariam melhor sem mim, disso tive esperança. Assim passou o tempo Que sobre a terra me foi dado. As forças eram mínimas. A meta Estava bem distante. Era bem visível, embora para mim Quase inatingível. Assim passou o tempo Que nesta terra me foi dado.   III Vocês, que emergirão do dilúvio Em que afundamos Pensem Quando falarem de nossas fraquezas Também nos tempos negros De que escaparam. Andávamos então, trocando de países como de sandálias Através das lutas de classes, desesperados Quando havia só injustiça e nenhuma revolta. Entretanto sabemos: Também o ódio à baixeza Deforma as feições. Também a ira pela injustiça Torna a voz rouca. Ah, e nós Que queríamos preparar o chão para o amor Não pudemos nós mesmos ser amigos. Mas vocês, quando chegar o momento Do homem ser parceiro do homem Pensem em nós Com simpatia.

Original (An die Nachgeborenen)

I Wirklich, ich lebe in finsteren Zeiten! Das arglose Wort ist töricht. Eine glatte Stirn Deutet auf Unempfindlichkeit hin. Der Lachende Hat die furchtbare Nachricht Nur noch nicht empfangen. Was sind das für Zeiten, wo Ein Gespräch über Bäume fast ein Verbrechen ist. Weil es ein Schweigen über so viele Untaten einschließt! Der dort ruhig über die Straße geht Ist wohl nicht mehr erreichbar für seine Freunde Die in Not sind? Es ist wahr: ich verdiene noch meinen Unterhalt Aber glaubt mir: das ist nur ein Zufall. Nichts Von dem, was ich tue, berechtigt mich dazu, mich sattzuessen. Zufällig bin ich verschont. (Wenn mein Glück aussetzt, bin ich verloren.) Man sagt mir: iß und trink du! Sei froh, daß du hast! Aber wie kann ich essen und trinken, wenn Ich dem Hungernden entreiße, was ich esse, und Mein Glas Wasser einem Verdurstenden fehlt? Und doch esse und trinke ich. Ich wäre gerne auch weise. In den alten Büchern steht, was weise ist: Sich aus dem Streit der Welt halten und die kurze Zeit Ohne Furcht verbringen Auch ohne Gewalt auskommen Böses mit Gutem vergelten Seine Wünsche nicht erfüllen, sondern vergessen Gilt für weise. Alles das kann ich nicht: Wirklich, ich lebe in finsteren Zeiten!   II In die Städte kam ich zur Zeit der Unordnung Als da Hunger herrschte. Unter die Menschen kam ich zu der Zeit des Aufruhrs Und ich empörte mich mit ihnen. So verging meine Zeit Die auf Erden mir gegeben war. Mein Essen aß ich zwischen den Schlachten Schlafen legte ich mich unter die Mörder Der Liebe pflegte ich achtlos Und die Natur sah ich ohne Geduld. So verging meine Zeit Die auf Erden mir gegeben war. Die Straßen führten in den Sumpf zu meiner Zeit. Die Sprache verriet mich dem Schlächter. Ich vermochte nur wenig. Aber die Herrschenden Saßen ohne mich sicherer, das hoffte ich. So verging meine Zeit Die auf Erden mir gegeben war. Die Kräfte waren gering. Das Ziel Lag in großer Ferne Es war deutlich sichtbar, wenn auch für mich Kaum zu erreichen. So verging meine Zeit Die auf Erden mir gegeben war.   III Ihr, die ihr auftauchen werdet aus der Flut In der wir untergegangen sind Gedenkt Wenn ihr von unseren Schwächen sprecht Auch der finsteren Zeit Der ihr entronnen seid. Gingen wir doch, öfter als die Schuhe die Länder wechselnd Durch die Kriege der Klassen, verzweifelt Wenn da nur Unrecht war und keine Empörung. Dabei wissen wir doch: Auch der Haß gegen die Niedrigkeit verzerrt die Züge. Auch der Zorn über das Unrecht Macht die Stimme heiser. Ach, wir Die wir den Boden bereiten wollten für Freundlichkeit Konnten selber nicht freundlich sein. Ihr aber, wenn es so weit sein wird Daß der Mensch dem Menschen ein Helfer ist Gedenkt unserer Mit Nachsicht.

, em “Poemas 1913-1956” [seleção e tradução de Paulo César de Souza], São Paulo: Editora 34, 2000, p. 212-214.

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