Nasci em Nova Era e a cidade já estava ali muito antes de mim, com suas ladeiras fatigadas, com sua igrejinha matriz e um rio de nome Piracicaba que passava sem nenhuma pressa.
Na infância, colecionei pedras, vi bichos mortos na estrada de ferro e silêncios nos quintais vizinhos. Tive também um manso medo dos sinos que tocavam anunciando qualquer coisa que eu não queria saber.
Nova Era era tão pequena que cabia num retrato 3x4 como este da minha parede aqui na metrópole. Nela cabia o mundo com seus tropeiros imaginários e as mulheres de lenço na cabeça acotoveladas nas velhas janelas, bordando o destino alheio.
Lembro que um dia a poesia me cochichou: “Você também vai embora, menino?” Fui. Mas ficou uma parte minha num banco de praça, numa curva do rio e em um nome gravado com faca no tronco do ipê.
O tempo me ensinou que a poesia não morava apenas em Itabira, no Rio, em Parral, no Porto ou em Paris. Descobri que ela estava sempre comigo, nas paredes da casa de barro onde nasci, na fuligem das lamparinas, no lamento dos curiangos, no murmúrio do riachos, no orvalho dos montes e nos raios de sol das manhãs novaerenses.
Hoje, dizem que Nova Era mudou. Duvido. Assim como mudaram o seu nome, a cidade pode ter mudado de roupa, mas continua com o mesmo coração batendo entre as montanhas da minha memória, feito um velho relógio parado que ainda insiste em dar as horas.
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Ausência
Nova Era ficou grudada em mim como poeira na pele do menino que corria descalço e feliz sem pensar no amanhã.
Não escolhi a minha casa, nem a ausência do pai. Os meus dias nasciam junto com a fome, com o cheiro do fogão de lenha e com o peito batendo por um amor adolescente que anos depois descobri ser proibido.
Passei a infância numa casa que fingia não ter segredos, com silêncios nos cantos, murmúrios atrás das portas e um quintal que me olhava como se adivinhasse os meus pensamentos.
Na escola, aprendi a ler. Os livros me ensinaram que o mundo era grande e os homens, pequenos.
Um dia me fui, levando pedaços da cidade nas dobras da memória. Alguma vez tentei esquecê-la, em vão. Ela sempre me vinha no cheiro de terra molhada, em um verso de canção ou nalgum tropeço da fala.
Saí de Nova Era, mas ela nunca saiu de mim, seguiu-me escondida no peito, esperando a hora de reaparecer num sonho, num poema, numa crônica, numa agonia qualquer nas manhãs de domingo.
Saí de Nova Era, mas ela nunca saiu de mim, seguiu-me escondida no peito, esperando a hora de reaparecer num sonho, num poema, numa crônica, numa agonia qualquer nas manhãs de domingo.
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Café de Minas
Hoje quero te preparar o café mais puro. Não é aquele café de máquina, artificial. É café de Minas Gerais, marrom-escuro, De grão colhido na hora, todo natural.
Café que a cada gole renova tua vontade de beber, Espesso, grosso, meio amargo, saboroso, Café quente, que te dá calor e te dá prazer, E de surpresa pode juntar-se ao leite mais gostoso.
Café torrado, brilhante, no exato ponto, maduro, Que derrete na tua boca e te deixa mole. Café das montanhas de Minas, de grano duro, Que te faz suspirar de prazer a cada gole.
Se quiseres, é só pedir que iremos agora, Ligeiros, expressos, saciar o desejo teu. De manhã, de tarde, de noite, a qualquer hora, Iremos sem demora, eu e o café, o café e eu.
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Passado, Presente, Futuro
O passado é o sujeito mais estranho que nasceu. Ele vive no meio da gente, sem saber que já morreu.
Não consigo viver sem pensar no passado, e ninguém consegue. Ele aparece sempre que estou mais absorto. Em qualquer lugar, a toda hora ele me persegue, E ninguém consegue fugir de quem está morto.
Às vezes temos a impressão de que ele está longe, Mas ele está a cada segundo do nosso lado. Só uma invisível linha que entre nós se esconde Separa o presente do que um segundo depois será passado.
Sem o passado, que tudo gerou, não haveria futuro e ninguém viveria. Sem ele ninguém sonharia, como esta noite sonhei. Ele é o cofre da vida, onde guarda nossas tristezas e nossas alegrias. Pra nunca esquecer das pessoas que tanto amei, Enquanto eu viver, quero lembrar do passado todos os dias.
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As pessoas não morrem; elas apenas dormem e partem
Quando eu me for, não digam que eu morri. Respeitem o meu silêncio quando eu partir. Alguém por acaso já lhes disse que morreu? Ninguém disse e jamais dirá. Nem eu.
A vida não é casa de um só corpo e de uma só voz. Dar abrigo a todos é o que a faz tão rica. Sua porta fica sempre aberta para todos nós. Entra um corpo, outro corpo sai, e a casa fica.
Nenhum humano pode me tirar daqui. Ninguém é capaz de saber da minha sorte. Quem não morreu não pode saber que eu morri. Não chamem o meu silêncio de morte.
Não matem as pessoas dentro do peito. Não as matem quando elas se vão, deixando o silêncio em seu lugar. Elas não morrem, elas apenas dormem, e partem, para encontrar nova vida onde todos nós depois vamos morar.
Parabéns Ver-O-Poema pela estupenda contribuição para a fomentação e a difusão da poesia, da literatura. Obrigado, D. Remisson, por nos trazer sua poesia. Da alma, da terra. Da emoção. Grande abraço deste companheiro.
Dom Celso, que alegria te ver por aqui. Realmente, o Ver-O-Poema é um trabalho maravilho que o Edmir realiza, divulgando tanto os escritores conhecidos quanto aqueles emergentes. Sinto-me privilegiado com a minha poesia aqui, e privilegiado pelo teu apoio. Nem preciso repetir que te admiro muito, né? Um abraço.
Elke Lubitz
3 meses atrás
O site é incrível e nós agradecemos. Encantei- me com os poemas de Remisson Aniceto, parabéns!
Olá, Octaviano, tudo bem? Obrigado pela tua leitura e pela tua presença aqui. Boa quarta-feira.
Remisson
3 meses atrás
Passo para agradecer ao Edmir Bezerra pela oportunidade dada à minha poesia. Ter meus textos compartilhados nesta página tão rica e diversificada me deixa muito feliz.
Você já parou para questionar se a literatura é realmente necessária? Em um mundo obcecado por produtividade, pontes e inovações tecnológicas, a arte da palavra parece falhar nos critérios de utilidade
O que pode a poesia diante do tempo e da memória? O que pode a poesia diante do espanto da Vida de uma vida e do Tempo de todos os tempos que sempre nos encontra em algum lugar anywhere out of the world?
Você já parou para questionar se a literatura é realmente necessária? Em um mundo obcecado por produtividade, pontes e inovações tecnológicas, a arte da palavra parece falhar nos critérios de utilidade
O que pode a poesia diante do tempo e da memória? O que pode a poesia diante do espanto da Vida de uma vida e do Tempo de todos os tempos que sempre nos encontra em algum lugar anywhere out of the world?
Jorge de Lima (1893-1953) é um dos pilares do Modernismo brasileiro. Sua obra transita entre o Nordeste mítico, a religiosidade profunda, o lirismo cotidiano e a experimentação formal.
O que pode a poesia diante do tempo e da memória? O que pode a poesia diante do espanto da Vida de uma vida e do Tempo de todos os tempos que sempre nos encontra em algum lugar anywhere out of the world?
Em Pssica, que na gíria regional quer dizer ‘azar’, ‘maldição’, a narrativa se desdobra em torno do tráfico de mulheres. Uma adolescente é raptada no centro de Belém do Pará e vendida como escrava branca para casas de show e prostituição em Caiena.
Um casal apaixonado. Uma intrusa. Três mentes doentias. Agora em uma edição especial de colecionador com capítulo extra inédito, conheça o thriller de estreia de Colleen Hoover, que se tornou um fenômeno editorial e best-seller mundial.
Parabéns Ver-O-Poema pela estupenda contribuição para a fomentação e a difusão da poesia, da literatura. Obrigado, D. Remisson, por nos trazer sua poesia. Da alma, da terra. Da emoção. Grande abraço deste companheiro.
Dom Celso, que alegria te ver por aqui. Realmente, o Ver-O-Poema é um trabalho maravilho que o Edmir realiza, divulgando tanto os escritores conhecidos quanto aqueles emergentes. Sinto-me privilegiado com a minha poesia aqui, e privilegiado pelo teu apoio. Nem preciso repetir que te admiro muito, né? Um abraço.
O site é incrível e nós agradecemos. Encantei- me com os poemas de Remisson Aniceto, parabéns!
Gratidão, Elke. Te desejo muita luz e inspiração.
👏👏👏
Grato, Vlado, pela visita. Um abraço!
Lindo de se ler! Parabéns!
Olá, Octaviano, tudo bem? Obrigado pela tua leitura e pela tua presença aqui. Boa quarta-feira.
Passo para agradecer ao Edmir Bezerra pela oportunidade dada à minha poesia. Ter meus textos compartilhados nesta página tão rica e diversificada me deixa muito feliz.