Leituras: 34

Resposta
A degradação é o passaporte do vilão,
A nobreza é epitáfio do nobre.
Olhe: como o céu dourado é inundado
do reflexo das sombras torcidas dos mortos.
Passada a época do gelo,
Por que ainda há gelo em toda a parte?
Já foi descoberto O Cabo da Boa Esperança,
por que mil velas ainda competem no Mar Morto?
Eu vim para este mundo
trazendo apenas papel, corda e sombra,
para anunciar antes do julgamento
a voz que tenha sido julgada:
Tenho de lhe dizer, mundo,
Eu-não-acredito!
Mesmo que haja mil desafiantes a seus pés,
conte comigo como o milésimo primeiro.
Não acredito que o céu seja azul;
Não acredito em ecos do trovão;
Não acredito que os sonhos sejam irreais;
Não acredito que a morte não seja retaliada.
Se o mar é destinado a quebrar os diques
deixe todas as águas amargas me encherem o coração;
Se o continente é destinado a crescer
deixe a humanidade optar por outro pico da existência.
Novas mudanças e estrelas a brilhar
estão a adornar o céu sem obstáculos;
São pictogramas de cinco mil anos.
São os olhos atentos das gerações futuras.
***
Festival da lua
Amantes com caroços na boca
fazem votos, regalam-se
até que o bebê dentro da água
espreitando seus pais pelo periscópio
nasça
Um visitante inesperado bate à porta
com determinação de adentrar
na profundidade das coisas
Árvores aplaudem
Ó, espere, a lua cheia
e a cartografia desassossegam-me
A minha mão folheando
mapas com significados obscuros
me deixa sentado na escuridão
por mais algum tempo, como
se estivesse sentado
no coração de um amigo
Esta cidade parece um convés
ardente no mar gelado
Pode salvar-se? Sim, já se salvou
Enquanto a torneira chora a fonte
gota a gota
***
Ramalá
Em Ramalá
os antigos jogam xadrez no céu estrelado
o fim de jogo move
uma ave imóvel num relógio
salta para dizer as horas
Em Ramalá
o sol sobre o muro como um velho
e segue pelo mercado
aberto espelhando-se aceso
numa placa de cobre oxidado
Em Ramalá
os deuses bebem água de um jarro de terra
um arco indaga de uma corda sobre as rotas
um garoto de prepara para herdar o oceano
da margem do céu
Em Ramalá
a morte lança sementes no zênite
a morte floresce defronte minha janela
árvores duras revelam
a forma violenta, original de um tornado
***
Um buquê
Entre mim e o mundo
és uma baía, uma vela
as pontas fiéis de uma corda
És uma fonte, o vento
um grito agudo da infância
Entre mim e o mundo
és uma moldura, uma janela
um jardim coberto de flores selvagens
És um fôlego, a cama
uma noite acompanhada por estrelas
Entre mim e o mundo
és um calendário, a bússola
um fio de luz deslizando nas trevas
És um currículo, um marcador de livros
um prefácio escrito no fim
Entre mim e o mundo
és uma cortina de tule, a bruma
uma lamparina que ilumina o sonho
És uma flauta, uma canção de silêncio
pálpebras semicerradas esculpidas na pedra
Entre mim e o mundo
és um abismo, uma lagoa
um precipício a cair
És um cerco, um muro
um emblema eterno no escudo
***
Bei Dao ( simplified Chinese 'Ilha do Norte', nascido em 2 de agosto de 1949) é o pseudônimo do escritor sino-americano Zhao Zhenkai (S: 赵振开, T: 趙振開, P: Zhào Zhènkāi). Entre os poetas de língua chinesa mais aclamados de sua geração, ele é frequentemente considerado um candidato ao Prêmio Nobel de Literatura. Além da poesia, é autor de contos, ensaios e um livro de memórias. Conhecido como um dissidente, ele é um proeminente representante de uma escola de poesia conhecida no Ocidente como "Misty" ou "Obscure" Poetry.
Nascido em Pequim antes do estabelecimento da República Popular da China, Bei Dao serviu como membro da Guarda Vermelha em sua juventude. Porém, desiludido com a Revolução Cultural, participou do Incidente da Praça da Paz Celestial de 1976 e co-fundou um influente jornal literário, chamado Jintian (Hoje), que chegou a ser oficialmente banido da China. Depois que sua poesia e ativismo serviram de inspiração para os protestos da Praça Tiananmen em 1989, Bei Dao foi banido da China e entrou em um período de exílio no Ocidente, vivendo e ensinando em vários países antes de se estabelecer nos Estados Unidos. Ele foi autorizado a retornar à China continental desde 2006, mas não o fez, exceto para breves visitas. Em 2007, ingressou no corpo docente da Universidade Chinesa de Hong Kong. Em 2009, tornou-se cidadão americano.
Bei Dao foi descrito como tendo desempenhado um papel significativo na criação de uma nova forma de poesia na literatura chinesa, que é frequentemente vista como uma reação às críticas artísticas da era Mao. Em particular, sua poesia é conhecida pela experimentação linguística e por abraçar a complexidade, até mesmo o paradoxo, em sua exploração da individualidade.